
São mais de 22.000 as peças pintadas à mão no átrio da Estação Ferroviária de Porto-São Bento, um imponente edifício inaugurado em outubro de 1916. A obra do pintor e ceramista Jorge Colaço (1868-1942) contempla azulejos azuis e brancos de rara beleza, as principais cores do brasão da cidade do Porto. A estrutura, localizada na no centro histórico da “Invicta”, está classificada como Imóvel de Interesse Público e, para lá de ter recebido inúmeros prémios e distinções, é considerada, por revistas internacionais especializadas, como uma das mais bonitas do mundo.
Aberta permanentemente ao público, é dali que partem e chegam diariamente largas centenas de pessoas, num constante movimento de comboios com ligações para todos os pontos do país. Uma obra admirável e muito admirada pelos estrangeiros que durante todo o ano acorrem a um dos principais pontos turísticos do Porto, localizado no centro histórico, a poucas centenas de metros da zona ribeirinha, onde o Rio Douro chega para desaguar no Oceano Atlântico.
A azáfama é grande e o trânsito por vezes é caótico. As obras da Linha Amarela do Metro do Porto seguem a bom ritmo, mas tarda em chegar o dia para que tudo volte à normalidade. Nunca será bem assim, pois a Estação de São Bento está inserida num local turístico de eleição e o majestoso edifício abriga no seu interior milhares de azulejos pintados à mão por Jorge Colaço, um exímio desenhador que deu vida a inúmeros trabalhos, encontrando-se representado em painéis de azulejo em mais de uma centena de locais.
As mais de 22.000 peças do átrio da Estação de São Bento foram pintadas entre 1905 e 1908 e retratam parte da história de Portugal, bem como variados costumes, essencialmente campestres. Trata-se da maior representação de azulejos da rede ferroviária nacional, onde podem ser apreciadas cenas como a Batalha de Aljubarrota e a Conquista de Ceuta, para lá de diversos eventos monárquicos, religiosos e rurais. A evolução dos transportes e temas alegóricos como a Indústria, as Belas Artes ou a Literatura, também estão expostos aos olhos dos curiosos, que não perdem o momento para apontar as objetivas a um tesouro de valor patrimonial incalculável.
Viagem no tempo em comboios históricos
Da admiração dos azulejos a uma relaxante viagem é um pequeno passo. Os comboios regionais e inter-regionais permitem as várias ligações de Norte a Sul do país. Para longos cursos em território nacional o Alfa Pendular e o Intercidades são os trens mais utilizados por terem menos paragens e atingirem velocidades superiores a 200 Km/hora.
Já os Regionais e Inter-regionais destinam-se aos percursos mais curtos, principalmente nas deslocações diárias para quem necessita deste tipo de transporte no dia a dia. Portugal dispõe de uma rede rodoviária bem apetrechada, mas há mais de 30 anos que se anda a falar no comboio de alta velocidade, que, segundo os diversos estudos e pareceres – um pouco ao exemplo do que acontece com a localização do novo aeroporto de Lisboa – deverá arrancar, se tudo correr bem, em 2029.
Mas deixemos por agora a alta velocidade para, bem mais devagar, falar do Comboio Histórico do Douro. Trata-se de uma viagem lindíssima no tempo e as carruagens circulam entre junho e outubro, meses mais agradáveis para este tipo de percursos, pois as temperaturas são mais amenas.
O trajeto é feito à beira do majestoso Rio Douro em cinco carruagens históricas rebocadas por uma locomotiva diesel pintada nas cores originais. Trata-se de uma viagem pelo passado com início na Régua, cidade do distrito de Vila Real, com destino à Região do Tua, com paragem no Pinhão, sempre com o Douro como pano de fundo. Esta é uma zona conhecida pelo famoso vinho do Porto – chamam-lhe o néctar dos deuses – inserida no Alto Douro Vinhateiro, uma paisagem única e espetacular, Património Mundial da UNESCO.
Normalmente o programa é feito num dia e há sempre muita animação regional, bem como a oferta de um cálice de “Porto” e dos tradicionais rebuçados da Régua. Na Estação do Pinhão, durante a paragem, podem igualmente ser apreciados os lindos azulejos que retratam a vida das gentes durienses.
Outra viagem inesquecível é o passeio no Comboio Presidencial, ainda que a aventura não seja para todas as bolsas. O projeto une a CP – Comboios de Portugal, a Fundação do Museu Nacional Ferroviário e o conceituado Chef Chakall, pelo que a experiência interativa é qualquer coisa grandiosa e, necessariamente, dispendiosa. Desde a receção na Estação de São Bento a meio da manhã, e a chegada a Ferradosa, local de rara beleza do município de São João da Pesqueira, os passageiros têm pela frente um programa atrativo e bem preenchido num ambiente luxuoso com música ao vivo.
A combinação da história da paisagem do Douro com a gastronomia e vinhos de excelência, é o cenário perfeito sobre carris a bordo de uma espetacular máquina a vapor construída em 1890. O comboio, uma das peças mais emblemáticas do Museu e que transportou altas figuras de Estado durante mais de um século, celebra, desta forma, a história ferroviária de Portugal.

Um mundo cá fora, a francesinha e as tripas
Fiquemo-nos então pela estação e pelas suas redondezas. Não muito distante do imponente edifício, bem no centro da zona histórica do Porto, há muito para ver. Dali pode avistar-se a Torre dos Clérigos e um passeio a pé até ao mais conhecido ícone da cidade, com a sua belíssima igreja, faz-se em 20 minutos.
A não perder, também bem perto da Estação de São Bento, é a Catedral do Porto, ou a Capela das Almas, na Rua de Santa Catarina. Ainda num círculo de poucas centenas de metros, a Avenida dos Aliados contempla uma infinidade de edifícios emblemáticos em granito, o maior dos quais o da Câmara Municipal do Porto, bem como algumas estátuas repletas de história, saltando logo à vista a de D. Pedro V, Rei de Portugal entre 1753 e 1861.
Arregalados os olhos, convém reconfortar o estômago. O local dispõe de restaurantes para todos os gostos, mas para quem visita o Porto há manjares imperdíveis. Um deles é a típica francesinha, uma sanduíche originária da própria cidade. Já numa ocasião falámos nestas nossas habituais “visitas” desta iguaria e demos como exemplo o “O Afonso” – Restaurante, pois, para lá da qualidade dos produtos, no seu interior pode ser observado um espetacular mini-museu em homenagem ao malogrado piloto brasileiro Ayrton Senna.
A casa fica situada numa artéria que dista sensivelmente quatro quilómetros do centro histórico, mas a oferta de transportes públicos é variada e facilmente se chega ao local. O espaço é algo limitado, pelo que se opção for para o jantar o melhor mesmo é chegar mais cedo, sendo que o espaço abre às 19h00. Vale a pena, disso não resta a menor dúvida, tanto mais que a sanduíche foi muito apreciada naquele espaço pelo chef Anthony Bourdain, que também já não se encontra entre nós.
As opções são muitas e algumas imperdíveis. Bem perto da Estação de São Bento há toda uma série de restaurantes de qualidade e pratos diversificados. Um dos que cai sempre bem dá pelo nome de tripas à moda do Porto. O pitéu é composto por tripas de vitela, diversas carnes de porco e galinha, enchidos e feijão branco, acompanhado por arroz seco. Não é por acaso que os habitantes desta cidade são chamados de tripeiros.
O manjar é um pouco pesado, acompanha preferencialmente com um bom vinho tinto, mas não pode faltar à mesa, nem que seja uma vez por mês. Assim, fica-se a saber que na cidade do Porto a típica francesinha e um recheado prato de tripas são marcas registradas e incomparáveis. Pode até dar-se o caso destas iguarias serem confecionadas num outro qualquer ponto do país, como efetivamente são, mas não é a mesma coisa. E nós, os tripeiros, temos muito orgulho do que é legitimamente nosso.
É jornalista, natural da cidade do Porto, Portugal. Iniciou sua carreira na Gazeta dos Desportos, tendo depois passado pelo Record, Jornal de Notícias e Comércio do Porto, jornais de referência em Portugal. Participou da cobertura de múltiplos eventos nacionais e internacionais (Futebol, Basquetebol, Andebol, Ciclismo e Hóquei em Patins). Foi coordenador redatorial do FITEI (Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica). É responsável pelas redes sociais de equipes de ciclismo e dirigente desportivo em uma associação de Ciclismo. É colaborador do PortalR3, publicando textos escritos em português de Portugal.

