José Mourinho assina por dois anos pelo Benfica e orienta a equipa no próximo sábado com o AVS para a Liga Portugal

O Special One regressa na mesma temporada à Liga dos Campeões por dois clubes diferentes, depois de ter orientado os turcos do Fenerbahçe, por ironia do destino eliminados pelo emblema da Luz

José Mourinho foi apresentado pelo presidente Rui Costa como sucessor de Bruno Lage
José Mourinho foi apresentado pelo presidente Rui Costa como sucessor de Bruno Lage. Foto SL Benfica)

Chamam-lhe Special One e Mourinho é bem o exemplo de um treinador especial, após uma carreira de muitos sucessos, o que em tempos lhe permitiu integrar a elite entre os melhores do mundo. O ex-técnico do Fenerbahçe sucede a Bruno Lage numa altura em as críticas eram muitas, principalmente depois do empate caseiro com os açorianos do Santa Clara para a Liga Portugal, agudizadas com a derrota por três bolas a duas com o Qarabag, do Azerbaijão, para a Liga dos Campeões, intragável para muitos por ter acontecido em pleno Estádio da Luz. O presidente Rui Costa não perdoou os deslizes e optou pela mudança de treinador, como o PortalR3 assinalou ainda ontem, salvaguardando, de certa forma, a derrota no ato eleitoral do próximo mês de outubro, que já estava a ser “anunciada” pelos adeptos encarnados.

A concentração mediática à volta de José Mourinho, desde que foi conhecida a sua ida para o Benfica, tornou-se quase um caso nacional. Toda a comunicação social, falada e escrita, não falou de outra coisa. Desde a sua chegada em jato privado ao aeródromo de Tires, em Cascais, não houve mais descanso. Perseguido – é o termo – até à moradia que possui em Azeitão, no distrito de Setúbal, foi acenando às pessoas que o reconheceram, sempre afável e bem-disposto. Hoje, logo pela manhã, novo “cerco” para o acompanhamento em direto até ao Centro de Estágio do Seixal, onde a equipa encarnada treina habitualmente. E foi lá que assinou o contrato com a duração de dois anos com o Benfica e se apresentou à comunicação social, para depois ministrar o primeiro treino aos futebolistas do clube da Luz. E no próximo sábado lá estará na Vila das Aves para defrontar o AVS Futebol que, curiosamente, também despediu o técnico José Mota.

“Quem é o treinador que diz não ao Benfica? Eu não”, estas foram as palavras mais sonantes à chegada de José Mourinho a Lisboa para um dia depois assinar o contrato. Na conferência de imprensa de apresentação do técnico, ladeado pelo presidente Rui Costa, houve direito a umas quantas perguntas, mas basicamente o tom foi sempre o mesmo. Vencer tudo o que há para vencer foi o lema. “Eu sou o treinador de um dos maiores clubes do mundo. Na cabeça de algumas pessoas, eu tenho dois currículos: tenho um currículo que durou um certo período de tempo e tenho outro que, na cabeça de muita gente, é uma fase menos feliz. A minha infelicidade é que, nos últimos cinco anos, joguei duas finais europeias. É a parte negativa da minha carreira. É dramático”, ironizou, numa alusão à sua passagem pela AS Roma.

Se há coisa que Mourinho nunca perdeu foi capacidade e sagacidade críticas, naturalmente quando sente que deve dar respostas a comentários menos agradáveis ou incómodos. Contudo, como o próprio confessou, também cometeu erros, um dos quais quando aceitou o convite para treinar na Turquia. “A minha carreira até agora foi rica, treinei nos maiores clubes do mundo, em diferentes países. Tive uma opção errada. Fiz mal em ir para o Fenerbahçe, não era o meu nível cultural, não era o meu nível enquanto futebol, não era. Obviamente que dei tudo até ao último dia”, explicou.

O novo treinador dos encarnados pretende cumprir o contrato de dois anos, ainda que o comunicado enviado à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) deixe em aberto uma eventual rescisão que pode ser acionada por ambas as partes. “A Sport Lisboa e Benfica – Futebol, SAD (“Benfica SAD”) informa que chegou a acordo com o treinador José Mário dos Santos Mourinho Félix para a celebração de um contrato de trabalho desportivo para vigorar até ao final da época desportiva 2026/27”, começa por dizer o comunicado. Mais se informa que, dez dias após o último jogo da época desportiva 2025/26, nas mesmas condições, tanto a Benfica SAD como o treinador poderão optar por não dar continuidade ao contrato para a época desportiva 2026/27”, lê-se no comunicado.

Já o presidente Rui Costa foi claro quanto à escolha. “Estou aqui, como presidente do Benfica e não como candidato. E como tal estou a escolher um treinador para o futuro do Benfica. A seguir ao Qarabag já se sentia que José Mourinho podia ser nome a vir para o Benfica, faz-me confusão que se fale em eleições. A minha responsabilidade é assegurar o melhor para o futuro do clube em qualquer circunstância. Irresponsabilidade seria deixar o clube sem treinador até às eleições. José Mourinho é treinador do Benfica, porque é José Mourinho, treinador com pergaminhos para estar à frente de equipa e clube da dimensão que temos. É um dos treinadores, repito, mais conceituados a nível mundial. A escolha não é assim tão difícil quanto isso”, sentenciou.

Trajeto com muito altos, mas também com baixos

Mourinho garantiu que nunca diria não ao Benfica
Mourinho garantiu que nunca diria não ao Benfica. (Foto: SL Benfica)

Mourinho nunca deixou de ser um nome consensual, mas teve os seus grandes momentos enquanto treinador e, logicamente, outros menos bons e até maus. Atualmente com 62 anos, o categorizado técnico regressa ao clube da Luz ao fim de 25 anos depois de uma primeira experiência no clube lisboeta, onde substituiu o alemão Jupp Heynckes. Tal como agora acontece, o momento era de eleições e com a mudança na presidência, de João Vale e Azevedo para Manuel Vilarinho, foi obrigado a abandonar o cargo ao fim de onze jogos, substituído pelo ex-futebolista internacional português Toni, então o trunfo do candidato vencedor.

Em 2001-02 viria a conhecer aquela que foi a fase que o catapultaria para outros voos, o primeiro ao serviço do FC Porto, onde todos o idolatraram. Ainda há poucos dias, aquando do encontro dos dragões com o Nacional da Madeira, a contar para a 5ª jornada da Liga Portugal, Mourinho sentou-se ao lado do presidente dos azuis e brancos André Villas-Boas, tendo recebido uma enorme ovação por parte dos adeptos portistas. O que, por certo, não acontecerá no próximo dia 5 de outubro, quando o FC Porto receber o Benfica, um dos maiores clássicos do futebol português. A rivalidade entre os dois colossos do futebol é de tal ordem – por vezes levada ao extremo com consequências indesejáveis -, que os assobios darão forçosamente lugar aos aplausos. Mourinho sabe disso e não teve qualquer problema em falar sobre o assunto, salvaguardando que “o respeito não vai mudar”.

Em janeiro de 2002, José Mourinho foi contratado pelo FC Porto, depois de uma reunião na conhecida zona da Mealhada, famosa pelo leitão assado no forno, com o antigo e já falecido presidente Pinto da Costa. E foi ao comando dos dragões que conheceu a glória, tendo conquistado, entre outros títulos, a Taça UEFA – hoje Liga Europa – diante dos escoceses do Celtic de Glasgow. No ano seguinte, em 2004, os portistas venciam a mais importante prova europeia de clubes, derrotando o Mónaco por três bolas a zero na famosa final de Gelsenkirchen, na Alemanha. Reconhecido e amado pelos adeptos azuis e brancos, Mourinho assinou contrato com o maior “inimigo” dos portistas, mas o passado ninguém o pode apagar.

Seguiu-se o Chelsea, de Inglaterra, na altura propriedade do russo Roman Abramovich, transformando-se num dos treinadores mais bem pagos do mundo. Da sua equipa técnica fazia então parte André Villas-Boas, atual presidente do FC Porto. Em terras de Sua Majestade conquistou a Copa da Liga Inglesa – atual EFL Cup – diante do Liverpool, para no ano a seguir sagrar-se campeão inglês pelo clube londrino, título que escapava há 50 anos e que repetiu na temporada seguinte.

Em 2007 deixou o Chelsea e pouco depois mudou-se para Itália para assinar pelo Inter de Milão, onde se sagrou campeão nacional em duas ocasiões, voltando a vencer a Liga dos Campeões, desta feita diante da poderosa formação do Bayern de Munique, comandada pelo holandês Van Gaal. Os feitos de Mourinho viriam a prosseguir no Real Madrid, onde orientou o astro Cristiano Ronaldo, para, depois de algumas conquistas internas, regressar a Londres e ao Chelsea de tão boa memória. Só que as coisas não correram como da primeira vez e em 2017 acabou por ser demitido, depois de na Premier League o clube inglês ter apenas somado 15 pontos em 16 jogos.

Chamado a orientar o Manchester United voltou a vencer a Liga Europa e os principais títulos nacionais, mas depois as coisas não correram bem e acabou demitido após uma derrota com o Liverpool para o campeonato. Seguiram-se o Tottenham, a AS Roma e o Fenerbahçe, mas já sem a auréola de outros tempos. Não se pode falar em declínio, mas a verdade é que, feitas as contas, Mourinho teve uma dezena de anos de enorme sucesso e outra dezena de resultados pouco conseguidos. O certo é que em relação às outras contas, as que caem na algibeira, Mourinho já recebeu mais de 100 milhões de euros apenas em indemnizações por despedimentos.

Vaz Mendes
É jornalista, natural da cidade do Porto, Portugal. Iniciou sua carreira na Gazeta dos Desportos, tendo depois passado pelo Record, Jornal de Notícias e Comércio do Porto, jornais de referência em Portugal. Participou da cobertura de múltiplos eventos nacionais e internacionais (Futebol, Basquetebol, Andebol, Ciclismo e Hóquei em Patins). Foi coordenador redatorial do FITEI (Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica). É responsável pelas redes sociais de equipes de ciclismo e dirigente desportivo em uma associação de Ciclismo. É colaborador do PortalR3, publicando textos escritos em português de Portugal.

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