
No primeiro semestre de 2025, foram emplacadas mais de 1 milhão de motos no País, de acordo com dados da Fenabrave, federação que reúne os distribuidores de veículos do Brasil. O volume significa crescimento de 10,33% na comparação com o mesmo período de 2024. Os números revelam: nunca se vendeu tanto moto no Brasil. Além disso, confirmam a projeção de que o segmento deve bater recorde e superar os 2 milhões de unidades vendidas até o final do ano.
A produção de motos acumulada entre janeiro e junho também ultrapassou a barreira de 1 milhão de unidades. Segundo a Abraciclo, associação que reúne as fabricantes do Polo Industrial de Manaus, houve alta de 15,3% sobre o mesmo período do ano passado e foi o melhor resultado da indústria nos últimos 14 anos.
Mas, afinal, por que está se vendendo tanta moto no Brasil? “Há diversos fatores”, acredita o presidente da Abraciclo, Marcos Bento. “Entre eles, podemos destacar a economia de combustível, o baixo custo de manutenção, a agilidade nos deslocamentos e o constante crescimento da utilização profissional. Com isso, a motocicleta se torna uma solução mais econômica e acessível de transporte para as diferentes regiões e cidades”, acrescenta Bento. Outro fator é a queda da atratividade do transporte público, que, ao longo das últimas décadas, tem visto uma redução dos usuários.
Desde os anos 2010 já se observa uma tendência de migração do modal do transporte coletivo para o individual em todas as faixas de renda. Entre as razões para a mudança estão a qualidade do serviço, o custo, o tempo das viagens e a cobertura dos sistemas, causando, assim, uma queda no número de passageiros. Por outro lado, a taxa de motorização cresce rapidamente: quase triplicou nos últimos 20 anos, explica a gerente da gestão da Mobilidade do Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP), Lorena Freitas.
“A aquisição de motos se mostra uma opção menos custosa (em comparação aos carros) de viabilizar o acesso às atividades de trabalho, saúde, lazer e acesso à cultura”, afirma. A pesquisadora cita o crescimento da frota nacional como prova desse fenômeno.
Atualmente, são mais de 35 milhões de motos – crescimento de 42% ao longo da última década, segundo dados da Senatran. O aumento de motos nas ruas foi acompanhado por elevação de 38,4% no número de condutores habilitados na categoria A, específica para veículos motorizados de duas ou três rodas.
Novos motociclistas
A fotógrafa Laís Cesare, 23 anos, foi a primeira da sua família a tirar carta de moto. Em outubro de 2024, Laís entrou para a estatística. Hoje, mais de 40 milhões de brasileiros estão aptos a conduzir motos ou similares. A jovem também faz parte de um grupo de motociclistas que não para de crescer: o público feminino. Segundo a Abraciclo, 33% das motos são vendidas para mulheres.
“O carro está muito caro”, diz Laís, explicando porque decidiu tirar a carteira A/B, que a permite conduzir automóveis e motocicletas. Laís mora na zona leste de São Paulo e viu nas motos uma forma rápida e barata de se locomover. Segundo ela, o trajeto de sua residência à faculdade leva duas horas de transporte público. De moto, são 40 minutos. Laís diz que sonha com uma scooter Yamaha NMax 160. “A gasolina também está cara”, diz. Com consumo de cerca de 40 km/litro, câmbio automático e preço de R$ 23 mil a scooter da Yamaha representa a maioria das motos vendidas no Brasil.
Entre as mais de 1 milhão de motos produzidas, a grande maioria é de modelos de até 160 cc. Ou seja, motos de baixa cilindrada usadas nos deslocamentos diários e também na logística e delivery. “Embora o segmento de baixa cilindrada ainda represente 79% do mercado, percebemos aumento pela procura de motos de média cilindrada”, diz Marcos Bento.
Segundo o executivo, trata-se de um movimento natural do consumidor, que opta por modelos com mais recursos tecnológicos e desempenho, passando a utilizar a moto também para lazer e viagens. “No primeiro semestre, o segmento médio respondeu por 19% do volume total produzido, o que corresponde a alta de 19,2% na comparação com o mesmo período de 2024”, diz.
O propagandista Carlos Silveira, de 37 anos, faz parte desses novos motociclistas que vêm na moto um hobby. “Quero uma moto para passear no fim de semana”, diz ele. O plano de Silveira, que mora em São Bernardo (SP), é comprar uma moto para pegar a estrada com os amigos. “Estou de olho em modelos clássicos e mais estilosos, como as Royal Enfield de 350 cc”, diz.
Geração de renda
Além da lacuna criada pelo transporte público, a moto se apresentou como uma possibilidade de geração de renda. Inicialmente, no transporte de passageiros, na figura dos mototaxistas, que vêm sendo incorporados às opções dos transportes por aplicativo. As motos, porém, também se mostram ainda mais importantes com o crescimento do delivery.
Um estudo desenvolvido pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) mostrou que o aumento da frota de motocicletas no Brasil se tornou mais forte a partir de 2016, justamente quando o crescimento do serviço de entregas por aplicativos também foi observado.
“Essa atratividade é especialmente notada nos casos de jovens de áreas periféricas”, alerta Lorena Freitas, do ITDP. “Por um lado, eles têm pior oferta de transportes públicos em seus territórios. E, por outro, passam a poder ganhar o próprio dinheiro, ainda que em condições de trabalho precarizadas”, analisa Lorena, que critica a remuneração inadequada e os limites na fiscalização desse tipo de serviço.