
Um artigo científico aponta ligações entre a microbiota intestinal e a doença de Parkinson, o que aumenta as possibilidades de tratamento, uma vez que a relação entre patologias no cérebro e alterações no microbioma intestinal podem levar a novas terapias.
A microbiota é composta por grande variedade de bactérias, vírus, fungos e outros microrganismos presentes no organismo.
“São décadas de estudo, hoje o que se acredita – tem o estudo dinamarquês, que é um estudo novo– é que existam pessoas nas quais a doença de Parkinson se inicia no cérebro. Inclusive, nós chamamos esse grupo de pessoas de brain first, primeiro cérebro. E existem outros grupos de pessoas em que a doença se iniciaria no intestino. E daí nós chamamos esse grupo de indivíduos de body first. Então existe essa linha de pesquisa em doença de Parkinson associada à microbiota intestinal e ao intestino”, explica a médica Jacy Bezerra Parmera, neurologista do Hospital das Clínicas e docente da Faculdade de Medicina (FM) da USP.
Jacy reforça que cerca de 90% dos pacientes com Parkinson sofrem de constipação e outros distúrbios gastrointestinais, sintomas que muitas vezes precedem os problemas motores, como tremores e rigidez. Uma proteína chamada alfa-sinucleína, quando mal agregada, está associada ao Parkinson e também é encontrada no intestino. “Essa proteína é encontrada no intestino e acredita-se que a hiperprodução dessa proteína possa estar relacionada a alterações da microbiota. Você, renovando a microbiota intestinal, poderia diminuir a hiperprodução dessa proteína alterada”, explica a especialista.
O tratamento testado na Bélgica – o transplante de microbiota fecal (TMF) – busca restaurar o equilíbrio intestinal. Jacy explica que esses ensaios clínicos ainda estão em fases iniciais (1 e 2), sendo realizados principalmente em centros europeus e norte-americanos. Ela ressaltou que, atualmente, não existem estudos específicos sobre essa abordagem para Parkinson no Brasil.
Mais evidências
A neurologista destaca a necessidade de mais evidências para comprovar se esse método pode se tornar um tratamento modificador da doença – capaz de interromper sua progressão, e não apenas aliviar sintomas. Ela enfatiza que, embora os tratamentos sintomáticos atuais sejam eficazes, a medicina ainda carece de terapias que possam estacionar o avanço do Parkinson.
Jacy destaca que é possível oferecer qualidade de vida aos pacientes mesmo com os tratamentos atuais. “Hoje a gente tem tratamentos medicamentosos que conseguem conter os sintomas por décadas”, explica. Além dos medicamentos, ela cita a importância da estimulação cerebral profunda para casos mais avançados e reforça a necessidade de acompanhamento multidisciplinar, incluindo fisioterapia e cuidados nutricionais.
Sobre os próximos passos da pesquisa, a neurologista é enfática: “É possível que existam pessoas que comecem no cérebro e outras no intestino. (…) Embora a gente tenha um tratamento sintomático eficaz, a gente realmente precisa muito de um tratamento modificador para estacionar a doença.”. Ela acredita que, quanto mais linhas de pesquisa forem exploradas, maiores as chances de se encontrar terapias inovadoras. “É importante a gente entender e diminuir o estigma da doença de Parkinson, no sentido de que, às vezes, as pessoas recebem o diagnóstico e acham que não vão ter tratamento, que não vão conseguir mais trabalhar, o que não é verdade”, finaliza.